- Milton escreveu:
- Curiosamente , se percebi bem, ele diz que as técnicas de gravação digital só deixam ouvir os sons e não a musica...
Diz ele que as distorções podem ser benéficas e fazer parte integrante da musica.
Diz ainda que "limpar" digitalmente uma gravação antiga é como agarrar no quadro da Mona Lisa e desnudá-la ao ponto de ficar apenas em cuecas, mas que o principal é o sorriso dela e não a roupa interior...assim como a musica, quando se torna demasiado "fiel" retira-lhe a alma e introduz elementos distrativos(sons).
É claro que essa tal "baixa fidelidade" a que ele não se refere( e que estes velhos do restelo teimam em ouvir) é ainda assim uma fidelidade suficiente para que uma peça de Bach tocada por ele num grand piano não soe a pianola de ragtime...
Na minha opinião, algumas das queixas do Zimerman (que se referem às gravações de música "clássica" e à reprodução das mesmas) podem ter como causa o uso de técnicas de gravação inadequadas (
multi- e
close-mic'ing) e/ou a reprodução com recurso a colunas cujo equilíbrio tonal está simplesmente "errado".
Mas compreendo perfeitamente o seu desagrado no que se refere a tocar (sozinho) em estúdio, sem a presença de uma audiência na plateia...vários outros intérpretes notáveis, tal como Günter Wand, preferem/preferiam gravar as suas
performances ao vivo.
Quanto à ideia de que "o detalhe interfere com a apreciação da música", concordo que podemos facilmente cair na tentação de ouvir sons em vez da música, ainda mais se tivermos interesse em audio, mas na minha opinião aí a culpa é nossa (a menos que estejamos a usar um sistema de de sonoridade "brilhante" e com a gama média "exagerada" e gravações tonalmente desequilibradas e com técnicas de captação inadequadas); desactivar o "modo de avaliação" requer uma certa auto-disciplina, e é uma tarefa mais difícil para os audiófilos que ouvem constantemente as mesmas gravações (audiófilas), que estão continuamente a afinar o seu sistema e sempre a mudar de equipamentos...o excesso de preocupação com o som e com o desempenho pode inibir o nosso prazer de escuta.
Além disso, é mais fácil concentrar-mo-nos na música quando estamos numa sala de concertos a "ouver" um programa musical específico do que em casa com os miúdos a fazer barulho, o telefone a tocar de vez em quando, a pensar na enorme colecção de outras peças musicais que podemos escutar ou com a faixa seguinte à distância de um toque no botão...
Para mim, a música não é apenas um conjunto de notas escritas na partitura mas o som de instrumentos acústicos "operados" por músicos que tocam essa música num espaço natural (aliás, acho que sou alérgico aos
samplers e aos sons gerados por computador...não suporto música electrónica).
Como tal, se existe distorção adicionada (do tipo "desagradável") e perda de detalhe na reprodução a minha relação emocional e intelectual com o som da música gravada e por conseguinte com a música é afectado de forma negativa; o som é menos "fiel" à realidade e a "musicalidade" sofre com isso.
Mas não tenho dúvidas que mesmo os melhores sistemas são incapazes de reproduzir o evento musical original.
E, a julgar pelo que eu "aprendi" nos fóruns e nos xôs, cada um de nós lida de forma diferente com os vários aspectos ou deficiências do processo de gravação e reprodução.
Algumas pessoas apreciam a "reverberação" e "brilho" extra gerados pela distorção harmónica, outros preferem o ruído de fundo do vinil em vez do "fundo preto" do digital, outros ainda gostam da sensação de "espaço" que resulta das reflexões da sala de reprodução...
Por isso acho que esta incapacidade de gravações e sistemas em reproduzir a realidade é suficiente para justificar, até certo ponto, a apreciação subjectiva do desempenho de reprodução e o desacordo entre aqueles que o julgam ou avaliam.
"Ao vivo" e "reproduzido" são coisas distintas e acho possível que para alguns seja necessário "acrescentar" qualquer coisa ao som reproduzido de modo a aumentar a sua "musicalidade".
R